Da Agência Reuters
O choque mais severo no acordo apressado para salvar o Credit Suisse está reservado para os detentores da parcela de títulos de maior risco do banco. Eles não apenas descobriram que são os únicos investidores que não receberão nenhuma compensação, mas também que a prática há muito estabelecida de dar prioridade aos detentores de títulos de dívida sobre os acionistas foi revista.
Os bancos já vinham pagando muito mais este ano do que no passado por esse capital híbrido, e agora não haverá compradores, disseram analistas.
As autoridades suíças que intermediam o resgate do Credit Suisse pelo UBS disseram que 16 bilhões de francos suíços (17 bilhões de dólares) de sua dívida Adicional de Nível 1 (AT1) terão baixa contábil a zero.
Os detentores de títulos AT1 foram colocados abaixo daqueles que detêm participações acionárias no Credit Suisse, que esperam receber 0,76 franco suíço por ação do banco.
O choque se espalhou pelos mercados asiáticos nesta segunda-feira, fazendo com que os swaps de inadimplência de bancos aumentassem e as ações caíssem. O índice global de ações de bancos estava em 84,59 pontos às 11h17 (horário de Brasília), abaixo do nível de 100 em duas semanas. As ações e títulos de bancos europeus caíram com investidores reavaliando o risco e o custo do capital dos bancos.
“Com a reestruturação do Credit Suisse, ninguém havia realmente pensado em como isso afetaria o pessoal do AT1 e esse era um risco grande”, disse Sean Darby, estrategista de ações globais da Jefferies.
A questão não está na estrutura dessa dívida, mas em como os mercados não estavam preparados para esse resultado em uma estruturação de dívida, disse ele.
“O que o mercado está dizendo hoje é que entre agora e o vencimento há um risco sobre essa dívida que não foi precificado corretamente à luz do que está acontecendo nos bancos dos EUA e do mundo.”
O título perpétuo de 8% em dólar do HSBC emitido em 7 de março estava sendo negociado a 90 centavos de dólar, disse um gestor de patrimônio.
Os títulos asiáticos AT1 caíram de 4 a 5 pontos, enquanto os europeus caíram 10 pontos, disse ele.
Um título AT1 de 1 bilhão de dólares do Credit Suisse com cupom de 4,5% foi ofertado a apenas 1 centavo de dólar, mostrou a precificação da Tradeweb. Um fundo negociado em bolsa listado em Londres que acompanha a dívida AT1 dos bancos despencava 6,2%.
“Quando um investidor compra um AT1, ele sabe que está abaixo da estrutura de capital em comparação com o sênior. Mas ele assume que está acima de ações”, disse Steven Major, chefe global de pesquisa de renda fixa do HSBC.
“As pessoas têm tentando entender o significado de tudo isso. Será difícil para novas emissões acontecerem quando você tem um grande alargamento dos spreads, com AT1s liderando o caminho.”
Criados na sequência da crise financeira internacional de 2008, os títulos AT1 são uma forma de dívida híbrida que conta para o capital regulatório dos bancos. Esses instrumentos foram desenhados como parte dos títulos de capacidade total de absorção de perdas (TLAC) para fornecer uma “fiança” ou uma maneira de os bancos transferirem riscos para os investidores e longe dos contribuintes se eles tivessem problemas.
Os títulos AT1, que também carregam um cupom mais alto, podem ser convertidos em ações ou amortizados quando as reservas de capital de um banco são corroídos além de um certo limite.
As reduções em valores dos AT1 ocorreram em vários países, incluindo Espanha, Grécia, Áustria e Dinamarca.
NA EUROPA É DIFERENTE
John Likos, diretor da BondAdviser, uma empresa de pesquisa do mercado de dívida e gestora de ativos, disse que os AT1s australianos contêm disposições que tornam muito difícil para os reguladores locais criarem uma situação como a do Credit Suisse em que os títulos híbridos foram a zero enquanto os detentores de ações recuperaram algum valor.
“Um universo paralelo bizarro e estranho em que a acionistas recebem algo e os credores de títulos híbridos não”, disse Likos.
No caso do Credit Suisse, o prospecto AT1 deixou claro que os detentores híbridos não irão recuperar nenhum valor.
“Achamos que é bastante negativo para AT1 e títulos TLAC mais amplos em todo o mundo, pois destacou os riscos inerentes presentes nesses instrumentos”, disseram analistas do Deutsche Bank em nota.
Os spreads de crédito nos bancos devem aumentar ainda mais, disseram analistas. Os spreads de swap nos bancos dos EUA, indicados pelo índice ICE BofA, já subiram para 198 pontos básicos, de 128 no início de março. Para bancos europeus com classificação BBB, o spread subiu 50 pontos em um mês, para 174.
“Se você obtém 10% de rendimento em algo quando o título do governo é 4%, então você está ganhando muito rendimento extra por algum motivo. Mas você entrou nisso acreditando que será sênior em relação aos acionistas, isso é o que preocupa as pessoas.”
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